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O crime de genocídio

Apontamentos relacionados à política de vacinação

Considerando as recentes manifestações na internet envolvendo o Presidente da República, chamado de “genocida” por milhares de pessoas nas mais diversas redes socais em virtude da atual crise provocada pelo aumento generalizado do número de casos de COVID-19 no país, levando a um colapso no sistema de saúde, se faz pertinente esclarecer o significado legal, para fins penais, do termo genocídio e das condutas que configuram esse crime.

Nas definições do dicionário Houaiss, genocídio significa: a) extermínio deliberado, parcial ou total, de uma comunidade, grupo étnico, racial ou religioso; b) por derivação, a destruição de populações ou povos; c) aniquilamento de grupos humanos, o qual, sem chegar ao assassínio em massa, inclui outras formas de extermínio, como a prevenção de nascimentos, o sequestro sistemático de crianças dentro de um determinado grupo étnico, a submissão a condições insuportáveis de vida etc.

O termo genocídio foi assim definido, inicialmente, pelo advogado polonês Raphael Lemkin como “um crime especial, consistente em destruir intencionalmente grupos humanos, raciais, religiosos ou nacionais e que, como o homicídio singular, pode ser cometido tanto em tempo de paz como em tempo de guerra”.

Portanto, pode-se concluir que genocídio é o assassinato em massa por questões étnicas, nacionais, raciais, religiosas e políticas, ato mediante o qual se visa o extermínio de um grupo ou uma coletividade.

Foi após o holocausto, genocídio organizado pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial, que houve a previsão de sua prevenção e repressão pela “Convenção para a Prevenção e Repressão do Crime de Genocídio”, em Paris (1948), incorporada ao ordenamento jurídico brasileiro pelo Decreto n.º 30.822, de 6 de maio de 1952.

No que tange ao direito pátrio, o crime de genocídio está previsto na Lei n.º 2.889/56, a qual basicamente replica o texto da convenção acima e imputa penas às condutas lá tipificadas. Em 1990 o delito em questão foi elevado à categoria dos crimes hediondos pela Lei n.º 8.072/90.

O art. 1.º da Lei 2.889/56 define quais condutas são enquadradas como crimes de genocídio, exigindo, para a sua tipificação, o fim específico de destruir no todo ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial ou religioso. São elas:

a) matar membros do grupo;

b) causar lesão grave à integridade física ou mental de membros do grupo;

c) submeter intencionalmente o grupo a condições de existência capazes de ocasionar-lhe a destruição física total ou parcial;

d) adotar medidas destinadas a impedir os nascimentos no seio de grupo;

e) efetuar a transferência forçada de crianças do grupo para outro grupo.

Em comento à alínea “c” acima, Victor Eduardo Rios Gonçalves (1) exemplifica que configura a hipótese prevista “manter o grupo em guetos ou campos­ de concentração onde haja proliferação de doenças ou dificuldade na obtenção de alimentos ou água, imposição de trabalhos forçados etc”.

Nos ensinamentos de Ricardo Antônio Andreucci (2), “basta que o sujeito ativo pratique qualquer das condutas descritas contra uma única pessoa do grupo para que seja caracterizado o genocídio, desde que haja a intenção de destruir, no todo ou em parte, grupo nacional, étnico, racial ou religioso”.

Como se pode notar, para que o agente (pessoa que pratica a ação) incorra na prática do crime em comento é necessário que haja com dolo, que “é a vontade consciente de realizar a conduta típica” (3) ou, em termos leigos, de praticar a ação (ou omissão) que está descrita na lei como crime.

No caso dos crimes de genocídio, deve haver a vontade dirigida, intencionalmente, com o fim específico de eliminar, total ou parcialmente, um grupo por sua natureza de ordem nacional, étnica, racial ou religiosa.

Encerrando os apontamentos ora formulados, entendo que não se amolda em nenhuma das hipóteses previstas na lei que define os crimes de genocídio as atuais decisões de cunho executivo, político-administrativo e de gestão em relação à segurança e à saúde, ainda que desprovidas de embasamento científico, contrárias ao clamor popular ou divergentes de medidas adotadas por governantes de outros países.

Bibliografia consultada:

    Gonçalves, Victor Eduardo Rios. Legislação penal especial esquematizado. – 3. ed. – São Paulo: Saraiva, 2017

    Andreucci, Ricardo Antonio. Legislação penal especial – 12. ed. atual. e ampl. – São Paulo: Saraiva, 2017

    Nucci, Guilherme de Souza. Manual de direito penal. – 12. ed. rev., atual. e ampl. – Rio de Janeiro: Forense, 2016.

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